A LEI DAS XII TABUAS.
Essencialmente aristocrática, a República (509 a 27 a.C.) tem o Senado como principal órgão de governo, onde os senadores exercem sua função em caráter vitalício. São responsáveis pela preservação da religião, supervisionam as finanças públicas, dirigem a política externa e administram as províncias. As funções executivas de governo são distribuídas entre uma estrutura burocrática chamada Magistratura. Os magistrados mais importantes são os cônsules, que possuem o poder imperium (poder militar exercido fora de Roma) e o potestas (administração, polícia e justiça dentro da cidade). Os outros ocupantes da Magistratura eram os Pretores, os Censores, os Questores, os Edis e os Tribunos da Plebe. Os Tribunos surgem ao longo da República, em conseqüência da luta dos plebeus por direitos políticos.
Em sua primeira manifestação, os plebeus abandonam a cidade e retiram-se para o Monte Sagrado, uma das sete colinas que formavam a cidade, em 494 a.C. A ausência de homens no exército e a constante ameaça do inimigo, fez com que os patrícios criem os Tribunos da Plebe, concedendo aos plebeus o direito de veto a atos do Senado. A segunda concessão é a Lei das Doze Tábuas (451-449 a.C.). As leis, até então transmitidas por via oral e totalmente manipuladas pelos patrícios, passaram a ser escritas e públicas, apesar de sua interpretação ter permanecido secreta, pois confiada apenas aos pontífices. As tábuas ficavam expostas no Fórum Romano, no centro da cidade.
As tábuas foram escritas por dez legisladores (os decênviros), os quais teriam tirado subsídios da legislação grega, não se trata de um código no sentido moderno do termo; não é talvez um conjunto de leis, antes uma redução a escrito de costumes, sob forma de fórmulas lapidares. Apesar de mais evoluída na área do direito privado (foi fundamento do jus civile) instituiu o processo penal e dispôs expressamente acerca das penas aplicáveis, muito embora a partir de então o direito romano tenha se desenvolvido com base nos éditos dos magistrados e na jurisprudência, fixada nos escritos dos jurisconsultis.
Tábua I (De in jus vocando - Do chamamento a juízo)
I- Se convocas alguém a presença do magistrado e ele se recusar, testemunha essa recusa e obriga-o a comparecer.
II- Se ele tentar fugir, prende-o e leve-o à força.
III- Se a doença ou idade o impossibilitarem, fornece-lhe condução, mas nunca uma carruagem, a não ser que queiras ser benevolente.
IV- Que um rico somente responda por um rico; por um proletário responda quem quiser.
VI- Não havendo acordo, que o magistrado conheça a causa antes do meio-dia, no comício ou no foro, depois da discussão dos litigantes.
VII- Passado o meio-dia, que o magistrado se pronuncie perante as partes presentes.
VIII- Depois do sol posto, nenhum ato mais de processo.
IX- Inciso incompleto que determinava ao magistrado a tomada de compromisso dos litigantes para comparecimento em determinado dia, caso o trabalho forense não fosse terminado.
Tábua II (De judiciis - Das instâncias judiciárias)
I- Inciso incompleto que determinava às partes o depósito de certa quantia, denominada sacramentum.
II- Se o juiz, ou árbitro ou uma das partes se achar acometido de moléstia grave, que o julgamento seja adiado.
III- Aquele que precisar do testemunho de alguém, vá a sua porta e o convoque em alta voz, para o terceiro dia de feira.
IV- Quem procede sem dolo não comete furto.
Tábua III (De aere confesso rebusque jure judicatis Da execução em caso de confissão ou de condenação)
I- Para o pagamento de uma dívida em dinheiro, confessada pelo devedor e por ela condenado, tenha ele o prazo de trinta dias para se desobrigar.
II- Decorrido esse tempo, seja preso o devedor e levado a presença do magistrado.
III- Não sendo líquida a dívida nesse momento e nem alguém oferecendo caução pelo devedor, seja ele preso por meio de correias com ferros de quinze libras aos pés, no máximo, podendo ser de menor peso, de acordo com o credor.
IV- Viva, então,o devedor às suas expensas e, em caso de não o poder, que o credor lhe dê uma libra de farinha por dia, no máximo.
V- Inciso incompleto que determinava que a dívida fosse apregoada após o prazo de três feiras, no sentido de haver um meio de remissão.
VI- Terminado esse prazo, o devedor seria morto, podendo ser cortado em pedaços, na hipótese de existirem vários credores. Mas a lei admitia também, o que era mais usual, a venda do devedor a um estrangeiro, para além do Tibre.
Tábua IV (De jure patrio - Do pátrio poder)
I- Que seja morta, segundo a Lei das XII Tábuas, a criança monstruosa.
II- Se o pai vendeu por três vezes o seu filho, que o filho seja libertado de seu pai.
III- Segundo a Lei das XII Tábuas (em caso de divórcio) que ele ordene a sua mulher que leve os seus trastes, e que ela entregue as chaves.
IV- Inciso que determinava o tempo da gestação, dispondo que a viúva poderia ter legalmente um filho até o décimo mês da morte do marido.
Tábua V (De haereditatibus et tutelis - Da tutela hereditária)
I- Inciso que declarava a mulher sob tutela perpétua.
II- Proibia o usucapião das coisas pertencentes às mulheres, pois sob tutela dos seus agnatos.
III- Aquilo que o pai de família houver testado relativamente aos seus bens, ou à tutela, terá força de lei.
IV- Se alguém morre sem ter feito testamento, sem herdeiro necessário, que o agnato mais próximo recolha a sucessão.
V- Se ele não tem agnato, que a sucessão se defira a estranhos.
VI- Não havendo tutor nomeado por testamento, os agnatos são os tutores legítimos.
Tábua VI (De dominio et possessione - Da propriedade e da posse)
I- Quando alguém cumprir a solenidade do nexo e da mancipação, o que sua língua declarar, isto será direito.
II- Este inciso determinava o pagamento de uma dupla multa àquele que relegar as suas palavras pronunciadas.
III- Adquiri-se a propriedade do solo pela posse de dois anos e das outras coisas, pela de um ano.
IV- Interrompe-se o usucapião da mulher se ela dormir durante três noites seguidas fora do domicílio conjugal.
V- Contra o estrangeiro, eterna vigilância.
VI- Se duas pessoas lutam pela posse de uma coisa diante do magistrado [...] o magistrado dará a posse a quem julgar conveniente.
V- Inciso incompleto
VII- Que não sejam arrancadas às traves empregadas nas construções, nem os esteios que sustentam as vinhas alheias.
VIII- Cabe uma ação de pagamento duplo contra aquele que emprega materiais de outrem.
IX- Se os materiais forem arrancados imediatamente... (o proprietário os poderá reinvidicar).
X- A propriedade de uma coisa vendida entregue, não é adquirida por aquele que a comprou enquanto o adquirente não paque o preço.
XI- Este inciso determinava que o magistrado confirmasse a cessão feita em sua presença, bem como a emancipação.
Tábua VII (De jure aedium et agrorum - Do direito relativo aos edifícios e às terras)
I- Entre os edifícios vizinhos deve existir um espaço de dois pés e meio, destinado a circulação. Todos os demais incisos recuperados são referentes ao direito de vizinhança.
Tábua VIII (De delictis - Dos delitos)
I- Pena capital ao autor de injúrias ou ultrajes públicos difamatórios.
II- Contra aquele que destruiu o membro de outrem e não transigiu com o mutilado, seja aplicada a pena de talião.
III- Pela fratura de um osso de um homem livre, pena de trezentos "as"; de um escravo, pena de cinqüenta "as".
IV- Pela injúria feita a outrem, pena de vinte e cinco "as".
V- Se o prejuízo é causado por acidente, que seja reparado.
VI- Pelo prejuízo causado por um quadrúpede, deve-se reparar o dano ou abandonar o animal.
VII- Cabe ação de dano contra aquele que faz pastar o seu rebanho no campo de outrem
VIII- Aquele que por encantamentos, faz murchar a seara de outrem, atraindo-a para o seu campo...
IX- Aquele que causa, à noite, furtivamente, destruição, ou apascenta o seu rebanho sobre colheitas, seja votado a Ceres e punido de morte; sendo impúbere, será vergastado ao critério do magistrado e condenado a reparar o dano em duplos.
X- Aquele que causa incêndio num edifício, ou num moinho de trigo próximo de uma casa, se o faz conscientemente, seja amarrado, flagelado e morto pelo fogo; se o faz por negligência, será condenado a reparar o dano; se for muito pobre, fará a indenização parceladamente.
XI- Contra aquele que corta injustamente as árvores de outrem, aplique-se a pena de vinte e cinco "as" sobre cada árvore cortada.
XII- Se alguém cometeu furto à noite e foi morto, seja o causador da morte absolvido.
XIII- Mesmo que o ladrão esteja roubando a pleno dia, não terá o direito de se defender com armas.
XIV- O ladrão confesso (preso em flagrante) sendo homem livre, será vergastado por aquele a quem roubou; se é um escravo, será vergastado e precipitado da Rocha Tapéia; mas sendo impúbere, será apenas vergastado ao critério do magistrado e condenado a reparar o dano.
XV- Inciso não recuperado
XVI- No caso de um furto manifesto, que a pena contra o ladrão seja do duplo do objeto furtado.
XVII- É proibido o usucapião sobre as coisas roubadas, não valendo, no caso, o uso ou a posse do detentor.
XVIII- O juro de empréstimo de dinheiro não poderá exceder de uma onça, isto é, de um por cento ao mês.
XIX- Aquele que for infiel num contrato de depósito, deverá pagar uma pena dupla.
XX- Que o patrono que enganar o seu cliente seja devotado aos deuses.
XXI- Serão afastados da tutela os cidadãos suspeitos, que a exercerem.
XXII- Se o porta-balança ou alguém foi testemunha de um ato e recusa dar seu testemunho, seja considerado infame, incapacitado para testemunhar e indigno de que testemunhem para ele.
XXIII- Seja precipitado da Rocha Tarpéia aquele que prestou falso juramento.
XXIV- (Pena de morte para o homicídio)
XXV- Aquele que prendeu alguém por palavras de encantamento ou lhe deu veneno, seja punido de morte.
XXVI- (Punia com a morte os ajuntamentos noturnos, de caráter sedicioso).
XXVII- Os membros de um colégio ou de uma associação poderão estabelecer os seus regimentos, desde que os mesmos não sejam contrários à lei geral.
Tábua IX (....)
Tábua X (De jure sacro - Do direito sagrado)
I- Que nenhum morto seja inumado ou queimado na cidade.
II- Que não seja polida a lenha da fogueira funerária.
III- O morto não poderá ser amortalhado nem cremado em mais de três togas, nem três faixas de púrpura e nem poderá ser acompanhado po mais de dez tocadores de flauta.
IV- Que as mulheres não arranhem o rosto e nem soltem gritos imoderados.
V- Que não se recolham os ossos dos mortos para se fazerem mais tarde outros funerais (exceto em relação aos mortos em combate, no estrangeiro).
Tábua XI (...) - Perdida no maremoto romano.
Tábua XII (De pignoris capio - Da apreensão do penhor)
I- (...)
II- Se um escravo comete um roubo ou um outro delito prejudicial, será movida contra o seu dono uma ação indireta, isto é, uma ação noxal.
III- Se alguém simular posse provisória em seu favor, que o magistrado nomeie três árbitros para a causa e que, em face da evidência, condene o simulador a restituir os frutos em duplo.
IV- É proibido consagrar-se a coisa litigiosa